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10-01-2024

É no inverno que se preparam as secas

Katila Ribeiro - Direção de Engenharia da AdP VALOR. Coordenadora executiva da Task Force de Gestão dos efeitos da seca de 2022 do Grupo Águas de Portugal“Não é de falta de água que nos podemos queixar. Talvez da sua irregularidade, das cheias catastróficas que ocorrem frequentemente um pouco por toda a parte e das secas severas que condicionam as atividades económicas sobretudo nas regiões do Sul do país, do desfasamento espacial e temporal entre a oferta e a procura, comuns a outras regiões da bacia do Mediterrâneo”. Foi assim que o meu professor de Gestão de Recursos Hídricos começou a sua primeira aula e é assim que devemos começar qualquer conversa, sem assombros, sobre este assunto.Em termos médios anuais, existe em Portugal uma disponibilidade média de cerca de 60 000 hm3, face a um consumo de 6 000 hm3 (o equivalente a “dois Alquevas”), excluindo os usos ambientais e não consumptivos (como a hidroeletricidade).Num “elevator pitch” descreveríamos assim a situação: os recursos hídricos são relativamente abundantes e o nosso país beneficia ainda de receber caudais provenientes de Espanha. Mas esses recursos estão irregularmente distribuídos no território, com o Tejo a marcar essa charneira: a Norte um país com um cariz fortemente atlântico e a Sul um território de características marcadamente mediterrânicas.Diríamos ainda que a precipitação é muito sazonal e sofre de uma distribuição interanual irregular, com secas e cheias frequentes. E remataríamos lembrando que estamos na bacia do mediterrâneo, uma região fortemente condicionada pelo efeito das alterações climáticas. Dito isto, perspetiva-se uma realidade nos próximos tempos: a água não vai faltar, mas vai ter uma outra distribuição sazonal e interanual e vai passar a ser mais escassa em grande parte do território.A seca de 2022 veio demonstrar-nos essa realidade. O ano hidrológico (que se inicia a 1 de outubro) de 2021/22 foi excecionalmente seco na Europa, com grande impacto na Península Ibérica. Em Portugal registou-se uma das situações de seca hidrológica mais grave deste século, com elevadas temperaturas e fraca precipitação. Este período teve as suas idiossincrasias: resultou de um acumular de 5 anos de precipitação abaixo da média e abrangeu regiões do país, como o norte, que costumam estar fora dos holofotes nestas situações. É no inverno que se preparam as secas, que se fazem sentir sobretudo no verão, e o Grupo Águas de Portugal preparou-se para esta situação. Como durante a pandemia, os serviços essenciais de abastecimento de água foram assegurados, sem uma única falha. Esse foi o trabalho invisível, articulado, minucioso e transversal da equipa dos quase 4 000 colaboradores do Grupo, de norte a sul do país. A fazer aquilo que sabemos fazer melhor: assegurar que a água não falta nas torneiras; e que a tratamos, depois de usada, em condições para que possa ser reutilizada ou devolvida ao ambiente.Os elementos da Task Force da Seca, criada em 2022 com a participação de todas as nossas empresas de abastecimento de água, fortaleceu o trabalho das nossas equipas espalhadas no território, garantindo a monitorização estreita da informação sobre as disponibilidades nas origens dos sistemas geridos pelo Grupo e a identificação das situações críticas e das medidas de contingência e mitigação, sobretudo as que implicavam a articulação com outras entidades.E para melhorar e continuar a assegurar o serviço de excelência que prestamos, deu-se início a uma nova fase, com o robustecimento e articulação das medidas de contingência e estruturais para aumento de resiliência dos sistemas no contexto da seca e escassez de água, cenários cada vez mais exigentes em termos de qualidade, quantidade e segurança. O esforço concertado, integrado e inovador dos vários atores do setor da água afigura-se essencial para que o País se prepare para os cenários de curto, médio e longo prazo. Nós continuaremos a desempenhar o nosso papel na gestão integrada e sustentável dos recursos hídricos e a “fazer a diferença na vida das pessoas”.Com os ingredientes certos -  antecipação, comunicação, planeamento, entreajuda, compromisso e partilha de conhecimento -, a receita é simples: basta juntar água.Artigo originalmente publicado na Visão Verde - veja aqui

10-01-2024

Água: mais que discutir

Pedro Vaz - Administrador da Águas de Portugal(I) A seca regressou. As alterações climáticas são uma realidade e em Portugal sentir-se-ão de forma crescente. Os períodos de seca intensificar-se-ão e as ameaças de escassez estão já aí. O que podemos fazer? Ser mais resilientes às alterações climáticas, mitigar os seus efeitos e estar adaptados o mais rapidamente possível aos impactos inevitáveis das mesmas.Tentarei, pois, contribuir com informação que permita saber que os homens e mulheres que dedicam a sua vida aos recursos hídricos trabalham diariamente pelas soluções de contingência quando a crise acontece, mas também pelas soluções estruturais que todos clamam, mas poucos percecionam.O país está já a fazer mais do que discutir soluções de resiliência e de adaptação, está a implementá-las, embora, nem todas visíveis, nem tão rápidas quanto desejaríamos. A resposta a este enorme desafio pressupõe um conjunto de soluções que só funcionarão se assumidas, geridas e implementadas de forma integrada pelos vários setores, e também isso se encontra em execução.(II) O percurso feito no abastecimento e saneamento nas últimas 3 décadas permitiu que atravessássemos, em 2022, um dos anos mais secos dos últimos 90 sem faltar uma gota de água nas torneiras. O “milagre português da água”, reconhecido internacionalmente pelos especialistas do setor, realizou se devido a um raro consenso político nacional nas últimas três décadas, numa  reforma estrutural que permitiu fazer investimentos de larga escala no país em infraestruturas (captações, estações de tratamento, redes de abastecimento, etc.), alavancados pela gestão profissionalizada do sector e por mais de 13 mil milhões de euros de fundos estruturais. Só que o consumo humano da água não encerra a importância da água na nossa atividade enquanto sociedade.O recurso hídrico é, e será cada vez mais, matéria de soberania e segurança nacional e a garantia do seu uso para a produção de alimentos e energia renovável é absolutamente vital, pelo que em situação de stress hídrico teremos de conseguir garantir a disponibilidade de água.(III) A seca, que se traduz num desequilíbrio entre recursos disponíveis (oferta) e as necessidades (procura), não é sempre sinónimo de escassez de água -. Neste balanço entre a oferta e a procura teremos também de introduzir as variáveis decorrentes das alterações climáticas e das projeções de evolução das necessidades hídricas para os próximos anos, sendo que os modelos permitem-nos projetar os cenários a médio longo prazo e funcionam como ferramentas de apoio à decisão política na gestão da água. (IV) O desenvolvimento do país precisa de pessoas, precisa de atividades económicas como a agricultura, o turismo e a indústria, precisa de ordenamento do território, precisa de ecossistemas saudáveis e precisa de energia limpa e renovável. Para tudo existir precisamos de água, o recurso mais transversal que dispomos.Atalhemos e permitam-me dar nota do que nos encontramos a fazer.(V.) O Algarve, a região do país onde as alterações estão a ser mais rápidas e intensas, é aquela onde as medidas em implementação estão mais avançadas. O sotavento algarvio, desde o último verão e com as medidas já realizadas, dispõe hoje de mais 15 hm3 de água para consumo urbano. Os últimos 2 anos ensinaram-nos, contudo, que é o barlavento algarvio a região mais exposta ao stress hídrico e não o sotavento.As medidas em curso, financiadas pelo PRR, representam um investimento de 200 milhões de euros. Pressupõem a redução das perdas no setor urbano e agrícola. Permitem transportar a água de um lado para o outro no Algarve em função da necessidade. Garantem mais água nas origens: 30 hm3 no Pomarão, 24 hm3 de dessalinização de água do mar e 8 hm3 de água reciclada das estações de tratamento de águas residuais (ApR).É preciso, contudo, um Pacto firme e resoluto de todos os agentes e protagonistas com a assunção de compromissos fortes para garantir a sustentabilidade do recurso. Com isso, o Algarve continuará a desempenhar o seu papel importante para o desenvolvimento do país.(VI) No Alentejo, o Alqueva (outra solução estrutural do país) é hoje um precioso ativo para a segurança hídrica. O panorama seria bem diferente sem a sua existência, apesar de ainda subsistirem problemas aos quais teremos de dar resposta, em especial no litoral alentejano. Aqui o desafio é diferente de todos os outros, pois está em causa a garantia de água para as necessidades agrícolas e industriais em Sines, estando, por isso, em marcha os projetos para a construção de duas dessalinizadoras que permitirão garantir a água necessária ao desenvolvimento de ambas as atividades.(VII) No restante território estão em curso outras medidas que permitirão ao país adaptar-se à nova realidade hídrica, garantindo que os territórios críticos possam, num curto prazo, ter soluções estruturais de resiliência. É o caso, por exemplo, da zona de Dão Lafões que tem há décadas um problema de déficit de água em alguns períodos do ano. Está já desenhada, com execução a breve prazo, a solução que permitirá interligar o sistema existente às origens de Lever, geridas pela Águas do Douro e Paiva e construir a nova barragem de Fagilde.Estas medidas permitirão dotar o país da resiliência necessária para combater a escassez, embora tenha de haver, em alguns territórios, uma adaptação das atividades atuais, quer sejam hidroelétricas, agrícolas, industriais, turísticas ou mesmo urbanas.Não poderá haver mais soluções individualizadas. A resiliência adquire-se com a combinação de várias soluções e a intervenção dos diversos setores: reduzindo consumos desnecessários, combatendo perdas no setor urbano e agrícola, garantindo interligações entre sistemas, melhorando as reservas superficiais existentes das albufeiras e barragens, disponibilizando água através de novas origens como é o caso da ApR e da dessalinização. Nós, na Águas de Portugal, trabalhamos diariamente, como muitos outros, para esta concretização e para que, mesmo nas situações mais críticas, a água não falhe.Artigo originalmente publicado na Visão Verde - veja aqui

10-01-2024

«Mãe, vai ter água?» - Porque fazemos o que fazemos

Fátima Loureiro - Águas de Portugal Internacional5h da manhã, estou no escritório, na baixa de Luanda, à espera da minha boleia para uma viagem de trabalho até ao norte do país. Mal aguento os olhos de tanto sono...só tarde na noite da véspera é que me foi dito que teria de viajar para ajudar a resolver um problema da maior urgência: a capital da província estava sem água havia mais de uma semana. Com um sorriso simpático de quem sabe que a notícia não vai agradar muito e respondendo rapidamente à expressão interrogativa que eu certamente fazia: «Sim, Fátima ...amanhã tem de ir ao Uíge... vêm buscá-la às...6h.». Seja!6h30 e nada... às 7h00 toca o telefone: “Dotôra, tive que ir pôr óleo no carro...estou a chegar”.8h00 e nada... 4 telefonemas depois... ”Estou aqui na Mutamba...mais 15 minutos e estou a chegar”.Um segundo pequeno-almoço e um segundo café....Às 9h00 da manhã, o carro finalmente chegou! O motorista, Sózinho de seu nome, não vinha sozinho...trazia a sua companheira. Faríamos os 3 a viagem até ao Uíge.Foi das viagens mais arrepiantes que já fiz: 360 curvas e praticamente todas elas feitas a cortar, pelo meio da floresta luxuriante em que pouco se vê. Eu a pedir mentalmente para que não aparecesse nenhum veículo de frente. Cheguei a pensar que talvez o Sózinho fosse moçambicano, dada a tendência que tinha em conduzir na faixa contrária. Ainda por cima, a noite dele também devia ter sido curta pois nem a música sertaneja que gritava no carro o impedia de, “quando em vez”, ir pestanejando. 6 horas de viagem. «Sózinho, não quer parar um bocadinho para descansar?». «Dotôra, não se importa?». «Eu? Nada!», parar dava para refrescar os olhos e beber água, das garrafas que levávamos connosco, e era um salvo-conduto para a nossa segurança.Chegámos, finalmente. A cidade estava sem água há alguns dias, supostamente por avaria da única bomba doseadora de coagulante que ainda estava operacional... Mas, além do problema da bomba, havia um outro problema maior: os funcionários estavam descontentes.Conversa para aqui, conversa para ali...lá se conseguiu arranjar uma solução alternativa e precária para o doseamento e arrancar com a bomba. Eu e os dois funcionários que consegui convencer a ficar pela promessa de um mata-bicho.Eu era a pula estrangeira que andava pela Estação, de gobelé na mão, a verificar a qualidade da água, a abrir e fechar válvulas, a subir e descer degraus, a ligar e a desligar bombas, para a frente e para trás a tentar arrancar uma estação que problemas tinha de sobra.Do outro lado da vedação esperavam ansiosas as mamãs e as meninas com os seus jarrican’s, bidões, latas e bacias vazias, à espera que alguém abrisse a torneira para o fontanário...«Mãe, vai ter água?», perguntavam-me insistentemente.Nesse dia, houve água ainda a tempo para cozinhar o jantar, para dar banho às crianças, para colocar a roupa em água e sabão para lavar no dia seguinte. Ao entardecer, os reservatórios estavam cheios de água e os rostos sorridentes. Eu estava morta de cansaço, de corpo moído pelos solavancos da viagem, mas cheia de vontade de partilhar esta felicidade. No regresso, estava mais leve e a condução do Sózinho foi bem mais apreciada.Esta é uma lembrança que já tem anos. Faz parte da coleção de memórias que guardo deste e de outros países por onde tenho andado, como Moçambique, São Tomé e Príncipe, Guiné Bissau, entre outros. Continuo, até hoje, esta caminhada pelo mundo e sinto-me privilegiada por ter um trabalho que ajuda a promover o acesso à água em países onde essa realidade, por umas razões ou outras, em nada é comparável à nossa.Às vezes são viagens muito tortuosas, que nos castigam os músculos, mas que me enchem a alma e me lembram porque é que eu, e outros como eu, andamos por lá a fazer o que fazemos, esquecendo todas as dificuldades que encontramos no terreno e que rapidamente tornamos minúsculas e banais. É saber que o fazer o que fazemos faz mesmo a diferença na vida das pessoas. Artigo originalmente publicado na Visão Verde - veja aqui

10-01-2024

A água no centro das políticas de desenvolvimento dos territórios

Alexandra Serra - Administradora da Águas de PortugalUm relatório recente da Agência Europeia do Ambiente refere que 30% da população europeia e 20% do território europeu são afetados pelo stress hídrico e que esta situação se irá agudizar à medida que as alterações climáticas irão gradualmente provocando um aumento da frequência, intensidade e duração das secas.Se por um lado, as alterações climáticas vieram reduzir os recursos hídricos disponíveis, por outro, o aumento de usos consumptivos tem vindo a colocar maior pressão nas disponibilidades de água. Maior procura e menor oferta resulta no aumento da escassez de água, que tendencialmente passa de conjuntural a estrutural em algumas parcelas do território, como as regiões do Mira, do Algarve e do Oeste.Para superar estes desafios, exigem-se novas abordagens integradas. Desde logo, um maior esforço na utilização eficiente da água, mais colaboração e articulação entre os setores utilizadores da água e a mobilização de origens de água não convencionais: a dessalinização e a reutilização. Todos os anos, no nosso país são rejeitados para os rios e para o oceano quase 600 milhões de m3 de águas residuais tratadas. Com um tratamento adicional, uma parte destas águas pode ser utilizada para usos não potáveis, aumentando as disponibilidades de água para os setores económicos que dela necessitam. Este é um verdadeiro desígnio ambiental e geracional.O Grupo Águas de Portugal tem em curso um programa nacional para a reutilização, com o objetivo de mobilizar progressivamente cerca de 100 milhões de m3 de água reciclada por ano para a agricultura, turismo e usos municipais. São vários os exemplos de projetos de reutilização já em operação, em parceria com municípios e com os setores económicos. Por exemplo, o campo de golfe dos Salgados, em Albufeira, é regado com água reciclada. Em Lisboa, os terrenos onde se irão realizar as Jornadas da Juventude estão a ser regados com água reciclada.No Algarve, 16 campos de golfe terão parte das suas necessidades de água satisfeitas a partir de água reciclada. O perímetro hidroagrícola da Várzea de Loures, com 700 ha de área regada, será irrigado com água reciclada proveniente da ETAR de Frielas. No pólo industrial de Sines, está em desenvolvimento a transformação da grande instalação de tratamento de águas residuais industriais para a produção de 10 milhões de m3 anuais de água para reutilização a consumir pelas indústrias da região. A primeira fase deste programa está focada na procura de água reciclada nas proximidades das ETAR. Mas é preciso ir mais longe e avaliar a viabilidade de transportar grandes volumes de água reciclada dos principais centros produtores até aos grandes consumidores, essencialmente a agricultura. É o caso da Lezíria do Tejo, que poderá vir a beneficiar das águas produzidas nas ETAR da Grande Lisboa e assim aumentar a resiliência face às variações do volume de água disponível no Tejo e ao avanço da intrusão salina. Ou o projeto Alviela XXI que possibilitará a rega de 2 400 ha. Este e outros projetos estão em fase de desenvolvimento, em articulação com os potenciais utilizadores. Portugal é reconhecido internacionalmente pelas mais importantes instituições como um caso de sucesso nos serviços de abastecimento de água e saneamento. Nas últimas décadas, o país evoluiu para indicadores de qualidade e universalidade que comparam com os melhores, a nível mundial. Esta é a década da construção de um novo paradigma de gestão integrada da água baseado em abordagens inovadoras, nas quais a reutilização é uma delas. Mais eficiência no uso da água, mais disponibilidades, mais resiliência: é nestas linhas que estamos a desenvolver, nos territórios, programas de medidas que reforçam a resiliência e que permitem garantir condições básicas do desenvolvimento sustentável para as próximas décadas. Nunca antes as políticas públicas de desenvolvimento dos territórios estiveram tão relacionadas com a gestão da água.Artigo originalmente publicado na Visão Verde - veja aqui

25-07-2023

Água: onde tudo começa e nada se perde

Ana Sofia Calado - Responsável da Área de Sustentabilidade e Responsabilidade Social da SIMARSULA economia circular visa manter os recursos nos ciclos produtivos o maior tempo possível, utilizando os resíduos gerados como novos recursos. Conceptualmente, a economia circular guarda um potencial enorme para melhorar as condições ambientais, sociais e económicas de um país, cabendo a cada pessoa ou entidade fazer mais e melhor numa lógica de criação de valor para a comunidade.Estima-se que a transição para uma economia circular possa gerar cerca de 700.000 postos de trabalho na UE até 2030 e representar um aumento adicional de 0,5 % do PIB da UE.Se cada um fizer a sua parte na partilha, na reutilização, na reparação, na renovação e na reciclagem de materiais e produtos existentes, o ciclo de vida dos produtos será alargado.Nesta enorme transformação cultural e de conceito, as empresas ligadas ao setor da água assumem uma responsabilidade acrescida, dado o papel crítico que desempenham na sociedade e o ciclo da água ser, ele próprio, naturalmente circular.A par da redução do consumo de recursos naturais, uma das importantes componentes da economia circular, embora menos falada, é a prevenção da poluição, essencial à proteção de ecossistemas estuarinos e marinhos.Este é um aspeto particularmente relevante no que respeita ao tratamento de águas residuais, como é o caso das empresas do Grupo Águas de Portugal, onde se integra a SIMARSUL, que tem trabalhado desde sempre numa lógica de transição para uma economia circular na atividade que desenvolve de recolha, tratamento e rejeição de efluentes, numa região com um importante capital natural como a Península de Setúbal.Isto significa que desvalorizamos o termo rejeição em favor de uma abordagem de destaque do enorme valor ambiental que a devolução das águas residuais tratadas aos meios hídricos tem para a preservação dos ecossistemas. Esta valorização é, também, destacada no que respeita à produção de Água para Reutilização (ApR), obtida a partir do tratamento de efluentes, de elevada importância, nos tempos de hoje, devido à escassez de água que resulta das alterações climáticas.Uma das ambições de sustentabilidade das empresas do Grupo Águas de Portugal é, precisamente, acelerar a economia circular da água, o que permitirá certamente acelerar este processo transversalmente a outros setores da economia, com impactos positivos quer ao nível do consumo de recursos naturais quer da redução de resíduos produzidos.Atualmente, cerca de 92% dos consumos de água nas nossas instalações é ApR  e pretendemos maximizar a reutilização interna e também o fornecimento externo, face aos potenciais interesses dos novos utilizadores, nomeadamente a indústria, o turismo, os municípios e o setor agrícola.Por outro lado, as lamas que resultam dos processos de tratamento da água residual são totalmente encaminhadas para valorização. Este subproduto do tratamento tem um elevado potencial agronómico, sendo rico em matéria orgânica e nutrientes, permitindo responder à carência de nutrientes e prevenir a erosão dos solos. Nesta valorização do nosso ciclo produtivo destacamos, ainda, o aproveitamento energético do biogás que é produzido no processo de digestão das lamas, nomeadamente a produção de energia elétrica e térmica, com relevantes ganhos económicos e ambientais.Consideramos muito importante a cooperação com outras entidades em projetos pioneiros e de elevada importância para a comunidade. É o caso da nossa participação no projeto piloto de Certificação em Economia Circular promovido pela ADENE “eCIRCULAR” – que classificou o nosso desempenho – e que avalia como as organizações gerem a água, a energia e os materiais e como promovem a circularidade na utilização destes recursos.Esta é uma excelente ferramenta para incentivar as organizações a evoluírem para a valorização máxima de recursos, permitindo igualmente ganhos enormes nas sinergias entre entidades, no sentido de umas aproveitarem como recurso o que pode ser um resíduo para outras.O ciclo da água - fonte de recursos - torna as empresas do setor da água o motor para a transição para uma economia circular em Portugal, incentivando a inovação para um futuro mais sustentável.Artigo originalmente publicado na Visão Verde - veja aqui